VACA LOUCA NO BRASIL

Ana Carla de Oliveira Baumgratz - Médica Veterinária

Recentemente as atenções do agronegócio brasileiro viram-se voltadas para a identificação de casos de “vaca louca” no país, um identificado em Belo Horizonte (MG) e outro em Nova Canaã do Norte (MT). Com o surgimento desses dois novos casos, o país passa a somar cinco casos da doença, desde a sua identificação na década de 80. O aparecimento da doença culminou com a suspensão temporária da exportação de carne bovina para a China, até que o governo chinês faça suas averiguações.
Conhecida popularmente como “vaca louca”, a Encefalopatia Espongioforme Bovina (EEB), é uma doença degenerativa que atinge o sistema nervoso dos bovinos, que cursa, principalmente, com agressividade e incoordenação, culminando com a morte dos indivíduos. A EEB é causada por uma proteína, o príon. Essa proteína é encontrada naturalmente no sistema nervoso dos bovinos, sendo essencial para manter a integridade dos neurônios. Mas através de mutações genéticas raras, presentes em grande número de animais, desencadeiam o surgimento dos príons, proteínas “defeituosas” e que tem a capacidade de se espalhar entre os bovinos e humanos.
A doença foi identificada pela primeira vez na década de 80, no Reino Unido. Mas foi na década de 90 que a doença causou grande pânico mundial, levando ao sacrifício de mais de 4,4 milhões de cabeças de bovinos, na tentativa de controlar a doença. Em complemento ao cenário da pecuária na época, houve dezenas de mortes de seres humanos, em decorrência da ingestão de carne contaminada.
Nos humanos, desenvolve-se como a Doença de Creutzfeldt-Jakob, também denominada como uma encefalopatia espongioforme subaguda, uma doença neurodegenerativa fatal. Os sintomas iniciais mais comuns são perda de memória, dificuldade progressiva de locomoção e visual, cansaço e rápida perda de peso. Há indivíduos que mantêm a doença incubada durante muitos anos. Identificada inicialmente em 1995, a doença causou a morte de mais de 170 pessoas até o momento. Não existe um tratamento eficaz para acabar com a doença, apenas medidas para retardar a progressão e dar qualidade de vida ao paciente.
Vale salientar que a doença não é transmitida entre os humanos, apenas pela ingestão de alimento contaminado. A EEB apresenta duas formas distintas, a clássica e a atípica. A forma clássica ocorre quando há ingestão de alimento contaminado pelos bovinos, ou seja, quando há fornecimento de produtos de origem animal (farinha de ossos e de sangue, principalmente) na dieta, prática abolida há muitos anos em nosso país pelo Ministério da Agricultura. Já a forma atípica ocorre de forma “natural” e esporádica em animais de idade avançada, os quais estão mais suscetíveis à ocorrência das mutações no sistema nervoso, animais esses que se tornam fontes de contaminação, caso após o abate sua carcaça não tenha o destino e o tratamento correto.
A forma atípica apenas foi identificada em meados dos anos 2000, após aprimoramentos nas técnicas de identificação dos príons na rotina dos órgãos de inspeção dos frigoríficos. No Brasil nunca foi identificada a EEB em sua forma clássica. Os dois casos que surgiram no início de setembro foram identificados como a forma atípica, a suspeita surgiu durante a inspeção antemortem, visto que, tratava-se de vacas de descarte que apresentavam idade avançada e estavam em decúbito nos currais. Em 2019, outro caso de EEB atípica tinha sido identificado no Mato Grosso, até então o último.
A suspensão das exportações para a China ocorreu devido ao estrito protocolo sanitário em vigor entre os países. O Brasil é líder de exportações de carne bovina para a China. Entre janeiro e julho, o país embarcou mais de 500 mil toneladas, ou seja, 38% das importações totais chinesas. Uma suspensão em longo prazo prejudicaria economicamente o Brasil e causaria um desequilíbrio nos preços do mercado, tendo em vista a importância do comércio bilateral entre os dois países. Após o surgimento desses casos brasileiros, em meados do mês de setembro, a Inglaterra notificou a identificação de um novo caso de EEB clássica no país, mas até o momento nenhum país havia imposto nenhuma restrição comercial ao Reino Unido.

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