INDEPENDÊNCIA, AUTONOMIA OU APENAS MUDANÇA DE STATUS?
MARCO ANTÔNIO SILVA
Quem nasceu primeiro: o ovo, ou a galinha?
Apesar da confusão mental causada pela idéia de ser impossivel ter havido uma galinha, sem que houvesse um ovo, é mais inteligente que primeiro um organismo se componha para depois estabelecer sua forma de reprodução.
Logo, indiscutivelmente se originou o ser, que buscou se reproduzir…
Pela mesma forma, ocorre com as povoações.
Na época em que o distrito do Rio do Peixe buscava sua emancipação de Barbacena, no final do século XIX, o Império do Brasil mantinha a organização política herdada de Portugal. Por essa organização, apenas as grandes aglomerações urbanas, dotadas de muitas ruas, edifícios, expressivo comércio, sede de bispado ou função administrativa, tinham o título de cidade, como Salvador (primeira cidade do Brasil) Rio de Janeiro, Paraíba (atual João Pessoa- PB), São Cristóvão – SE, Natal-RN, São Luís – MA, Belém-PA e Recife-PE. As demais povoações sedes de munícipios eram todas designadas como Vilas, muitas delas sendo até capitais de capitanias e províncias.
Somente em 1823, por um decreto Imperial, todas as vilas capitais de província puderam ser chamadas de “cidade”, caso de Ouro Preto, que foi até esse ano uma vila, a Vila Rica, capital da capitania e província de Minas Gerais. Mariana foi elevada a cidade simplesmente por que nela morava o bispo, e um bispo, como Príncipe da Igreja, não poderia morar numa vila…
Algumas vilas foram honradas pelo Imperador com o título de cidade, como forma de distinção, caso por exemplo de Barbacena, designada por Dom Pedro I como “Nobre e Mui Leal Cidade de Barbacena”, por sua fidelidade ao Imperador.
Apesar disso, as vilas tinham suas Câmaras Municipais, autonomia administrativa e tributária, sendo cabeça de distrito, às vezes com grande área territorial. Muitas vilas eram sedes de Comarca, com estabelecimento de toda a estrutura judiciária, caso das vilas de Barbacena e Rio das Mortes (São João del Rei).
Assim, por exemplo, a vila de Santo Antonio do Paraibuna se separou de Barbacena, em 1850, ganhando somente seis anos depois um título de cidade, por seu desenvolvimento.
Com o Rio do Peixe, não foi diferente!
O distrito buscou na Assembléia em Ouro Preto sua autonomia administrativa e desmembramento de Barbacena, obtendo vitória nessa luta no dia 03 de outubro de 1881, pela Lei Provincial Mineira número 2.804. A sede do novo município era a Vila do Rio do Peixe, que apesar de não ter sido instalado, já havia sido criado por lei, existindo juridicamente.
A confusão das datas é gerada aqui. Um atraso na instalação do município, fez com que demorassem três anos para sua instalação.
O Presidente da Câmara de Barbacena, a quem por lei cabia instalar o novo município dando posse aos primeiros vereadores, retardou ao máximo a instalação, alegando motivos vários, todos sanados pelas lideranças riopeixenses.
A pendenga só se encerra em 30 de outubro de 1884, quando finalmente os riopeixenses aceitam mudar o nome de sua vila para Cidade de Lima Duarte, homenageando o sogro do Presidente da Câmara de Barbacena, que, lisongeado, vem e instala finalmente o município em 29 de dezembro de 1884!
Vale lembrar que alguns municípios comemoram a data de sua instalação, o que também tem sentido lógico, pois passam a existir de fato nesta data. Em resumo: sem correr risco de erro, poderíamos comemorar o 03 de outubro de 1881 (emancipação de direito) ou o 29 de dezembro (instalação de fato). Nunca o 30 de outubro, que foi apenas uma mudança de status, aliás bem politiqueira…
Somente em 1938, TODAS as sedes de munícipio foram elevadas à categoria de Cidade, fazendo com que muitos pensassem que era assim desde o início.
Apesar de no brasão municipal constarem as datas 1781: abertura do território à povoação por Dom Rodrigo e 1881: emancipação de Barbacena, houve quem considerasse a data de 30 de outubro 1884, sabe-se lá por que motivo, gerando inclusive uma Lei Municipal criando o Dia do Aniversário da Cidade, em 1976.
A pesquisadora Maria de Lourdes Sacramento combateu ardorosamente este erro, sendo seus apelos ouvidos pelo então vereador Evandro Fontes de Oliveira, que encampando a idéia, transformou-a em projeto de lei, que aprovado, corrigiu uma distorção histórica de anos.
A lei, aprovada, e que está em vigor, é a seguinte:
Lei nº 1.023
Altera a data comemorativa do aniversário da cidade.
A CÂMARA MUNICIPAL DE LIMA DUARTE APROVOU, E EU, PREFEITO MUNICIPAL, SANCIONO A PRESENTE LEI:
Art. 1º – Fica o Prefeito Municipal de Lima Duarte, autorizado a celebrar como data oficial do Aniversário de Lima Duarte o dia 03 de outubro de cada ano, que será considerado Feriado Municipal.
Art. 2º – Revogam-se as disposições em contrário, especialmente a Lei 527 de 16 de setembro de 1976.
Art. 3º – Entra esta Lei em vigor em 1º de janeiro de 1998.
Dada e passada na Secretaria da Prefeitura Municipal de Lima Duarte, aos 10 dias do mês de dezembro de 1997.
Sancionada por Ney Carvalho de Paula – Prefeito Municipal
Apesar da incorreção do texto da lei, o 03 de outubro é a data da emancipação do município e não o aniversário da cidade….
Lembra-se do ovo e da galinha?
A cidade, no nosso caso, só poderia vir se antes houvesse a vila e o município. Logo, o que vem primeiro é que deve ser comemorado.
Por estes “erros”, tivemos um Centenário aos 103 anos….
Mas aí já é outra estória….
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