UM CASCAVEL NO EXÉRCITO, O VISCONDE E O ARTISTA…
Minha primeira experiência fora de Lima Duarte foi passada um ano e dezenove dias em Juiz de Fora! Jovem, 18 anos, apresentei-me ao Serviço Militar e fui selecionado, indo servir no Décimo Sétimo Batalhão Logístico, com quartéis no Bairro Fábrica e ao lado do Museu, no Mariano Procópio. Um belo prédio antigo, comprido e alto, assoalhado e com muitas janelas seria minha casa, “laranjeiro”, como tantos outros que de fora de Juiz de Fora vieram…
Conversa vai, conversa vem, vamos aos poucos descobrindo as origens dos desconhecidos membros da companhia, que sairá dali grupo de amigos: Rio Pomba,(gêneros em desalinho) Divino (que se falasse “de Carangola”, dava briga), Leopoldina, Muriaé, Matias Barbosa (quase sempre só “Matias”), Tombos, Tabuleiro (que não podia nunca ser “do Pomba”), Bicas (na verdade São Manoel)… Fora os procedentes de bairros e distritos de Juiz de Fora, muitos…
_Mas e tu? De onde é? pergunta um vizinho, carioca do brejo…
_ Sou de Lima Duarte, respondo.
_ Ah, é cascavel! kkkk ….. E o apelido já pega…
_ Lima Duarte? Onde fica? – retruca outro.
_ Perto daqui, pro Sul de Minas. – respondo…
_ Ah, aquele artista da Globo, né, eu sei, arrisca outro.
_ Mas por que cascavel?
_ O Lima Duarte nasceu lá?…
Nessas perguntas muito de nossa identidade, mais ainda de nossa História…
Desde criança ouvia casos de onças, assombrações e cobras! As cobras eram tantas que apareciam em todos os lugares, dormindo no meio das lenhas, dentro do quentinho dos fornos, saindo dos cupins ou dos buracos de tatu. Eram ditas como traiçoeiras, perigosas, por isso deveriam ser mortas. Morrer “ofendido de cobra” era coisa comum por aqui, fosse cascavel, jararaca ou urutu… Muitos ganharam o apelido de Cascavéis por suas qualidades parecidas com a do réptil…
A fartura de cobra era tanta que virou artigo de exportação: de trem, seguia de Lima Duarte para o Instituto Butantã um vagão cheio de caixas de cobras, sempre na rabeira, caso descarrilasse…
E dizem que um descarrilou, enchendo de lima duartinos (ops, cascavéis) o terreno perto de Igrejinha…
Assim mais a fama aumentou, a ponto de cascavel ficar sinônimo de lima duartino.
A “Terra do Cascavel” nasceu Dores do Rio do Peixe, sendo parte da Comarca do Rio das Mortes (atual São João Del Rei, que em 1791 foi dividida, ficando o nosso território pertencendo à Vila de Barbacena. O Dores é uma referência à Padroeira Nossa Senhora das Dores, e o Rio do Peixe, ao principal curso d’água da região, vertendo águas para a Bacia do Paraíba do Sul. Em 1839, o arraial virou vila sede de Distrito, passo importante para emancipar-se anos mais tarde. Em 03 de Outubro de 1881, após muita relutância de políticos de Barbacena, finalmente emancipa-se, tornando-se o Município de Rio do Peixe. Até aí, nada de Lima Duarte!!
A Lei rezava que cabia ao Presidente da Câmara do Município de origem (Barbacena) proceder a escolha dos vereadores do novo município, dar-lhes posse e instalar a nova câmara municipal. Para isso, colocava como condições a existência de um prédio decente para a Câmara e Cadeia e outro para uma escola pública de Primeiras Letras, exigências prontamente atendidas. A última das exigências a ser cumprida foi a eleição dos sete primeiros vereadores do município do Rio do Peixe, ocorrida em 7 de setembro de 1884, dois anos, onze meses e quatro dias depois da criação do município por lei e ainda assim, com muita pressão dos líderes rio peixenses sobre a Presidência da Assembléia Provincial em Ouro Preto. Faltava apenas a instalação do município. Apesar de satisfeitas as exigências legais, Barbacena retardou ao máximo a instalação do município. Era Presidente da Câmara de Barbacena o senhor Antônio Carlos Ribeiro de Andrada III ou “O senador”, casado com Dona Maria Adelaide Feliciana de Lima Duarte, irmã do Barão e depois Visconde de Lima Duarte.
Barão e Visconde de Lima Duarte era o título dado por Dom Pedro II ao médico e político brasileiro José Rodrigues de Lima Duarte, nascido em 1826 em Barbacena e falecido aos 03 de dezembro de 1896 no Rio de Janeiro. Era filho de Feliciano Coelho Duarte Badaró e de Constança Emídia Duarte Lima. Formou-se em Medicina em 1849, clinicando por muitos anos em Barbacena. Como médico, tornou-se exemplo de caridade, dedicação e abnegação, fazendo da profissão um verdadeiro sacerdócio.
Dr. José Rodrigues de Lima Duarte, líder do Partido Liberal em Minas Gerais, era considerado um homem de coração generoso e bondoso, muito popular e querido pelos correligionários e respeitado pelos adversários filiados ao Partido Conservador. Dotado de extrema simplicidade era celebrado como homem simples, afável, consagrado às causas do povo, sempre celebrado por seu caráter reto e humano.
Entrou para a atividade política em 1854, sendo sucessivamente Deputado Provincial e Deputado Geral. Presidiu a Câmara Municipal de Barbacena de 1861 a 1881 e foi Presidente da Câmara dos Deputados de 1882 a 1884, além de Senador do Império de 1884 a 1889. De 1880 a 1882, foi Ministro da Marinha do Brasil. Por ser mineiro e nunca ter servido à Armada, era chamado de “Ministro da Marinha do Mar de Espanha”.
Emancipado, o Município do Rio do Peixe aguardava sua instalação desde 1881.Sem explicações para tanto atraso, em 30 de outubro de 1884, vota-se a lei que simplesmente concedia à vila do Rio do Peixe o título de cidade, mudando seu nome para Cidade de Lima Duarte. Sessenta dias depois, em 29 de dezembro de 1884, o senhor Andrada vem a Lima Duarte, instala o município e dá posse aos vereadores eleitos. Uma simples mudança de nome remove todas as resistências barbacenenses e tira um atraso de três anos e dois meses no nosso processo de emancipação de Barbacena, dando ao reduto de conservadores um nome liberal…
Dezenas e dezenas de anos mais tarde, Ariclenes Martins, um jovem ator em começo de carreira, ouve de produtores que seu nome não é apropriado para um artista. Em conversa com sua mãe, que tinha orientação espírita, essa sugere-lhe o nome do Dr. Lima Duarte, seu espírito guia de luz, para seu nome artístico…
Assim nasceram os “Cascavéis”, a “Lima Duarte” e o “Lima Duarte”! Nessa ordem…